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Até macacos rejeitam recompensa injusta


Artigo de Eugenio do Carvalhal, Coordenador do curso de Formação de Negociadores da FGV e Professor do MBA em Gestão Empresarial da FGV.

Os negociadores deparam-se cotidianamente com uma grande quantidade de desafios. Dentre eles cabe destacar aquelas situações onde é negociada a divisão de algo que você construiu ou ajudou a construir, o rateio de algum ganho expressivo ou a distribuição de recursos e recompensas. É importante recordar como você vivenciou uma situação na qual o poder maior estava com a outra parte.

Como você se sentiu ao receber uma oferta ofensiva ou uma recompensa injusta? Qual foi o sentimento ao perceber que tinha sido enganado? E quando essa sensação associou-se a uma derrota na qual percebeu que houve manipulação? Você não estava só. De uma certa forma nós estamos acompanhados por primos primatas, macacos-pregos que também rejeitam recompensas injustas.

Segundo Sarah Brosnan e Frank de Wall, especialistas em comportamento de primatas: macacos-pregos, chipanzés, gorilas, principalmente no que têm em comum com humanos, “durante a evolução do processo cooperativo pode tornar-se um fator crítico para os indivíduos comparar com seus próprios esforços e recompensas com os dos outros. Reações negativas podem ocorrer quando as experiências são frustradas. Uma teoria propõe que essa aversão à injustiça pode explicar a cooperação humana no contexto do modelo das escolhas racionais”.

Parece que muitos executivos poderosos e dirigentes orientados só para resultados não percebem que tendemos a ser animais cooperativos. Há um senso comum de que quanto mais frágil é o indivíduo mais ele busca compartilhar e mais facilmente oferece sua ajuda. Nas instituições, a boa vontade do altruísta, via de regra, é usada para viabilizar os interesses dos mais fortes. No plano mais amplo a injustiça distributiva agrava as disparidades sociais pela proliferação de práticas predatórias. A manipulação de práticas predatórias tem ocupado muito espaço nas negociações em todos os planos.

Sarah Brosnan e Frans de Wall, por meio do sua pesquisa, demonstram que os macacos-prego, que constituem uma comunidade tolerante e colaborativa, no seu trabalho com outros membros do grupo, respondem de forma negativa quando recompensas são distribuídas de forma desigual.

Duplas de macacos recebiam comida (pepinos ou uvas) quando entregavam fichas aos pesquisadores. Quando ambos recebiam a mesma recompensa o desempenho das tarefas fluía sem problemas. Porém, em outros momentos os pesquisadores variavam as recompensas: para um davam uvas (que eles adoram), para o outro pepinos; ou ainda alteravam a quantidade dada a cada macaco. O macaco que recebia uma recompensa inferior recusava-se a receber ou jogava fora. A irritação era mais intensa quando a outra parte recebia sem nada ter feito.

A manipulação, muitas vezes, é manifestada nas intenções e ações de bastidores, através do nepotismo, da proteção sectária, em outras, é verbalizada mediante um discurso autoritário-condicionador ou chantagem corporativa-emocional. A injustiça distributiva muitas vezes é praticada através de recompensas irrisórias, reconhecimentos insignificantes, migalhas douradas, em outras, é materializada pela apropriação das ideias da criatividade, da iniciativa e do trabalho dos outros.

Lembre-se, quando tiver mais poder, que ao agir de forma injusta e ferir a estima da outra parte, poderá desencadear emoções, que poderão manifestar-se desde o leve desconforto até a compulsiva vontade de retaliar. A outra parte poderá reagir extravasando a irritação de um macaco-prego ou a agressividade de um gorila... e de qualquer forma, cedo ou tarde, você será percebido como um manipulador.

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